Meus amigos, quando um Profissional da área da dermatologia, cosmetologia e estética se depara com uma paciente gestante, não há a menor dúvida de que em muitos pode surgir um sentimento de insegurança.
Não é por menos, a incerteza de indicar ou prescrever algo que possa ser potencialmente tóxico deve de fato, ser algo com que devemos nos preocupar.
Existem alguns Profissionais que direcionam seus tratamentos usando uma antiga categorização feita pelo FDA em 1979, que divide as substâncias em 6 categorias, conforma vocês podem ver na lista abaixo.
Categoria A: em estudos controlados em mulheres grávidas, o fármaco não demonstrou risco para o feto no primeiro trimestre de gravidez. Não há evidências de risco nos trimestres posteriores, sendo remota a possibilidade de dano fetal;
Categoria B: os estudos em animais não demonstraram risco fetal, mas também não há estudos controlados em mulheres grávidas; ou então, os estudos em animais revelaram riscos, mas que não foram confirmados em estudos controlados em mulheres grávidas
Categoria C: não foram realizados estudos em animais e nem em mulheres grávidas; ou então, os estudos em animais revelaram risco, mas não existem estudos disponíveis realizados em mulheres grávidas
Categoria D: o fármaco demonstrou evidências positivas de risco fetal humano, no entanto, os benefícios potenciais para a mulher podem, eventualmente, justificar o risco, como, por exemplo, em casos de doenças graves ou que ameaçam a vida, e para as quais não existam outras drogas mais seguras;
Categoria X: em estudos em animais e mulheres grávidas, o fármaco provocou anomalias fetais, havendo clara evidência de risco para o feto que é maior do que qualquer benefício possível para a paciente;
Categoria Indeterminada: não foi classificada pelo FDA. Nesse caso, utilizar outras opções.
Essa categorização até nos ajuda a selecionar, ou não ativos como ácido salicílico, que é considerado categoria C e não deve ser aplicado em grandes áreas, ficando a critério do profissional definir o risco. O ácido lático e ácido glicólico tem baixa permeação e são considerados seguros na gestação, mas mesmo assim devemos modular o pH e a concentração para evitar irritações que possam estressar a paciente.
Onde entram os milhares de ingredientes cosméticos aqui? Boa pergunta, pelo que aprendemos, os cosméticos são de venda livre e, portanto, seriam totalmente seguros? Não é bem assim. Podemos usar exemplos de ingredientes cosméticos como ureia, cânfora ou retinóides (com exceção da forma ácido, este não é considerado cosmético). Este que acabei de citar são recomendados que um médico deve avaliar seu uso. Como fazer pra saber? Talvez indicar apenas produtos comprovadamente testado e aprovado por gestantes? Esse cenário é o mais difícil de achar, afinal, que empresa vai arriscar usar gestantes em testes de segurança e eficácia?
O que todo profissional deve ter ciência é dos riscos que um determinado ingrediente cosmético pode causar. Eu gosto de considerar os seguintes riscos:
1. Irritação: um ingrediente pode ser irritante e neste caso, ele não apresenta risco de permeação, e não apresenta risco direto ao feto, mas pode danificar a barreira cutânea e permitir a permeação de outras substâncias. Além disso, uma irritação, uma vermelhidão (eritema) podem gerar desconforto à futura mamãe, causando um estresse desnecessário.
2. Alergia: ingredientes alergênicos são aqueles que na maioria das pessoas, mesmo as gestantes, não causa nenhum tipo de problema, mas em gestantes com peles sensíveis pode desencadear uma resposta do sistema imunológico, levando a uma resposta cutânea, que pode ser uma leve vermelhidão até um processo inflamatório agudo. As fragrâncias de conservantes são listadas como as principais substâncias com potencial alergênico em cosméticos. Embora assuste as gestantes, o bebê não é afetado.
3. Efeito sistêmico: aqui é onde mora o maior perigo, pois estamos falando de ingredientes que atravessam toda a barreira cutânea e podem cair na corrente sanguínea. Isso jamais deveria acontecer, mas temos dados em literatura que mostram que ingredientes com moléculas pequenas e lipossolúvel conseguem atingir a corrente sanguínea. Um exemplo desses ingredientes é a benzofenona-3 (B-3), um filtro solar usado em fotoprotetores. É ainda pior quando há indícios sobre o impacto destes ingredientes nos receptores hormonais. Nesta classe ainda podemos citar os parabenos. Lembrando que tanto a B-3 quanto alguns parabenos são permitidos em cosméticos e considerados como seguros pelos órgãos regulatórios.
4. Ingredientes polêmicos: nesta classe eu considero aqueles ingredientes que não tem comprovação que causam qualquer problema, mas que a mídia não científica decretou que ele é um risco. É o caso do alumínio usado em antitranspirantes. Aqui devemos ficar bem atentos, pois ao escolher um ingrediente desse, podemos acabar com nossas imagens através de influenciadores digitais, que atualmente tem maior credibilidade do que muitos de nós.
Fontes de informação
Sinto dizer que nem eu e nem ninguém tem uma tabela com o que pode e o que não pode usar em gestantes. Temos algumas substâncias clássicas que consideramos seguras, mas devemos saber estudar os ingredientes e tirar nossas próximas conclusões sobre o risco de usar ou não determinado ingrediente.
Pubmed e Pubchem
Use o Pubmed para avaliar se estudos de segurança já foram realizados. Use o Pubchem para avaliar o perfil molecular da substância, como tamanho de molécula e solubilidade.
EWG
É uma Organização Não Governamental que possui um site chamado de Skin deep, onde os ingredientes cosméticos são classificados de 1-10 dependo do nível de periculosidade. Aquela polêmica do chumbo no batom ganhou notoriedade por causa deles.
Site Campaign For Safe Cosmetics
Aqui você vai encontrar os ingredientes potencialmente tóxicos. O publico leigo usa muito para questionar vários ingredientes. Tem muita coisa legal, mas também tem muita coisa questionável. Usa um pouco de sensacionalismo.
Órgãos regulatórios
FDA, SCCP, ANVISA. Aqui encontramos se pode, o que não pode, quais as concentrações máximas, advertências e precauções que devem ser descritas nas rotulagens quando um ingrediente é entendido como um risco. Mas cuidado, atualmente os sites que citei acima tem um poder até maior do que os órgãos regulatórios, ou seja, parabeno é permitido em cosméticos, mas use para ver o que acontece. Provavelmente você será questionado do risco eminente do seu produto.
Procedimentos estéticos em gestantes e lactantes
Abaixo listei os principais procedimentos estéticos e através de um conteúdo extraído de estudos publicados, listei as categorias e substâncias utilizadas.
Anestésicos injetáveis
Lidocaína: categoria B, considerada relativamente segura para uso durante a gravidez em doses usadas em procedimentos dermatológicos.
Benzocaína, bupivacaína e mepivacaína, tetracaína: categoria C, não há estudos para definir adequadamente o risco durante a gravidez.
Anestésicos Tópicos
2.5% lidocaína / prilocaína: categoria B, considerada segura. Evite superfícies oculares.
Benzocaína: categoria C.
Tetracaína: categoria C, preferida para procedimentos palpebrais / perioculares.
Heinonen et al., 1977 Hagai et al., 2015 Moore, 1998 Richards and Stasko, 2002
Guay, 2009 Lee et al., 2013
Peelings químicos
Ácido glicólico: penetração dérmica relativamente segura e limitada.
Ácido láctico: Relatos de uso seguro para acne gestacional, penetração dérmica limitada.
Ácido salicílico: categoria C, penetração dérmica significativa, limita o uso a pequenas áreas de cobertura.
Solução de Jessner e Peeling de TCA: use com cautela, Jessner contém ácido salicílico, TCA na urina materna correlacionada com retardo de crescimento fetal, embora o TCA tenha usado o tratamento de condiloma genital na gravidez com segurança.
Andersen, 1998 Lee et al., 2013 Bozzo et al., 2011 James et al., 2008
Zhou et al., 2012 Schwartz et al., 1988
Neuromoduladores
Toxina botulínica A: Relatos de casos sugerem nenhum dano ao feto com o uso da toxina botulínica cosmética ou em outras indicações médicas (profilaxia da enxaqueca, acalasia, distonia cervical) na maioria dos pacientes.
Abortos relatados em dois pacientes em dois relatos, mas a relação com a injeção de toxinas não é clara.
Altas doses de toxina onabotulínica (> 600 U) associadas à fraqueza sistêmica.
Não há evidências suficientes para recomendações concretas. Se a toxina botulínica cosmética for realizada durante a gravidez, os formulários de consentimento devem listar a gravidez como contra-indicação.
Tan et al., 2013 Hooft et al., 2015 Wataganara et al., 2009 Robinson and Grogan, 2014 Bodkin et al., 2005 Newman et al., 2004 de Oliveira Monteiro, 2006 Morgan et al., 2006
Laserterapia e Fototerapia
Nenhuma recomendação concreta pode ser feita para o uso de lasers para procedimentos cosméticos.
Lasers Nd-YAG e CO2 têm sido usados com segurança para tratar condiloma genital em pacientes grávidas em vários relatos. Holmium: os lasers YAG e luz intensa pulsada foram utilizados com sucesso e segurança para tratar a urolitíase durante a gravidez.
A remoção permanente de pelos não é recomendada durante a gravidez devido à falta de dados de segurança. Os pacientes são aconselhados a depilar, depilar e usar cremes depilatórios.
Schwartz et al., 1988 Adelson et al., 1990, Woźniak et al., 1995 Gay et al., 2003 Buzalov and Khristakieva, 1994 Adanur et al., 2014 Carlan et al., 1995 Lee et al., 2013
Espero ter contribuído com ferramentas para que vocês, Profissionais da Saúde possam aprender mais sobre a segurança dos ingredientes e assim, utilizar com mais confiança.
Abraços
Lucas Portilho
Referências
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